Cartazes da
campanha eleitoral de Israel, com Benny Gantz (à esquerda) e Benjamin
Netanyahu, em fevereiro.ODED BALILTY / AP
Os pontos-chave do pacto que encerra mais de um ano de impasse
em Israel
Netanyahu
ganha proteção em seus processos judiciais, e Gantz leva ministérios
importantes no Governo
“Tendo
em vista a crise sanitária e econômica em Israel, assinamos um acordo de
governo de emergência nacional.” Esta é a explicação aparente do pacto de coalizão firmado na
segunda-feira entre o conservador Benjamin Netanyahu, que há um ano e meio ocupa de forma interina o cargo de primeiro-ministro,
e o centrista Benny Gantz, que nesse tempo o havia
desafiado três vezes nas urnas, com resultados
inconclusivos.
Em uma
fórmula de grande coalizão pactuada no fim do confinamento, Israel tenta se vacinar contra a instabilidade em plena pandemia de coronavírus depois
do prolongado impasse político —com as quartas eleições legislativas no
horizonte— e a ameaça da maior recessão em 72 anos de história do Estado
judaico.
Mas
há mais. “Netanyahu conseguiu incluir a maior parte de suas promessas
eleitorais (....) em troca de reservar metade dos ministérios para Gantz e a
promessa de lhe ceder o cargo”, resume o colunista Nahum Barnea no jornal Yedioth
Ahronoth. “Se virar primeiro-ministro no ano que vem, o feito de Gantz se
elevará ao nível do extraordinário. Só com o tempo se saberá”, escreve Ben
Caspit no Maariv, refletindo como muitos analistas da imprensa
local desconfiam da palavra do atual governante, que no passado já traiu todos os aliados situados à sua
esquerda.
Estes são os
principais pontos-chave do acordo:
Alternância
no poder por lei
Netanyahu
prosseguirá à frente do Executivo durante 18 meses, que somará aos seus 14 anos
de mandatos acumulados, e entregará o cargo a Gantz. Para formalizar a rotação
de poder, o Knesset (Parlamento) deverá aprovar, antes de três semanas, uma
legislação especial que garanta seu cumprimento. “Não é um pacto político, é um
contrato”, salienta Anshel Pfeffer em sua análise no Haaretz.
“Gantz não é um sócio, e sim um guarda-costas para os três próximos anos [de
legislatura]”.
Anexação
territorial na Cisjordânia
O líder
centrista abriu mão do direito de veto que pretendia ter sobre a
anexação dos assentamentos judaicos e do vale do Jordão na Cisjordânia. O
primeiro-ministro terá via livre para “aplicar a soberania israelense” sobre
grande parte do território palestino sob ocupação militar desde 1967.
O eufemismo
da extensão da lei israelense às colônias, mencionado no plano de paz apresentado em fevereiro pela
Casa Branca, “representará o fim da solução com dois Estados”, adverte Mohamed
Shtayeh, chefe de Governo da Autoridade Palestina. Netanyahu insiste em
acelerar a anexação, que deve ser avalizada pelos Estados Unidos, antes de
correr o risco de que Donald Trump seja afastado da presidência nas urnas no
próximo mês de novembro.
O gabinete
mais amplo da história
Israel
contará com o Gabinete com maior número de pastas em sua história —até 36
ministros e 16 vice-ministros— para poder acomodar todas as forças da coalizão.
Além da presidência do Parlamento, o partido Likud, de Netanyahu, se reservará
Finanças e Segurança. O Azul e Branco, aliança de Gantz, ficará com Defesa,
Relações Exteriores e Justiça e espera atrair deputados do minguante
trabalhismo — partido histórico com o qual projeta se fundir— para que pilotem
Economia e Assuntos Sociais. Os ultraortodoxos continuariam controlando Saúde e
Interior (que em Israel não dirige a polícia, competência da pasta de
Segurança), e a extrema direita, se decidir finalmente permanecer na coalizão,
terá a Educação.
O acordo
inclui a criação de uma segunda residência oficial para o “primeiro-ministro
alternativo”, ou vice-premiê, concebida para manter o privilégio de que Netanyahu desfruta do ininterruptamente desde
2009 quando passar o bastão a Gantz. “Tudo isto é realmente necessário, em um
tempo de crise econômica e com um milhão de desempregados [26% da população
ativa]?”, questiona a colunista Sima Kadmon no Yedioth.
Blindagem
judicial
Outra
garantia extraordinária dada ao primeiro-ministro nas cláusulas de coalizão é o
poder de vetar a nomeação de altos cargos judiciais, incluindo o de
procurador-geral, enquanto tramita seu processo por três casos de corrupção, que deve
começar em 24 de maio. Também impôs a exigência de acordo unânime entre seus
representantes e os de Gantz no comitê de seleção de juízes do Ministério da
Justiça.
Netanyahu
teme sobretudo que o Supremo possa privá-lo da permanência no poder por causa
de três solicitações legais, apresentadas na segunda-feira por grupos políticos
e da sociedade civil, para que o Alto Tribunal fixe sua doutrina e estabeleça
se um réu (por fraude e suborno, no caso dele) está ou não autorizado a exercer
como chefe do Governo. O veto da jurisprudência atualmente só afeta os
ministros, não o chefe do Executivo. O pacto de coalizão prevê que, se
Netanyahu for afastado pelos juízes, o Knesset será automaticamente dissolvido,
com a convocação de novas eleições legislativas.
Uma saída
digna para um estadista?
O calendário
parece desenhando para que Netanyahu, de 70 anos, possa se livrar dos seus
processos judiciais. O presidente do Estado de Israel, o octogenário Reuven
Rivlin, conclui seu mandato no final de 2021, quando o líder do Likud já teria
cedido o cargo a Gantz, de 60 anos. Se conseguir ser eleito pelo Knesset como
novo chefe de Estado, Netanyahu gozará então de um mandato presidencial de sete
anos (renovável) com imunidade plena perante a Justiça.
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